Um artigo recém-publicado no Journal of Archaeological Science: Reports indica que as pedras de Stonehenge foram levadas até a Planície de Salisbury por humanos, e não por geleiras, como defendia uma das teorias mais populares desde a década de 1990.
Nova pesquisa contesta transporte glacial
A conclusão baseia-se na reavaliação do Newall Boulder, pequeno fragmento de rocha retirado do monumento em 1924. Estudos anteriores atribuíram marcas em sua superfície à abrasão subglacial, sugerindo que uma geleira teria arrastado blocos de várias partes da Grã-Bretanha até o sul da Inglaterra.
Os autores do novo trabalho analisaram novamente essas marcas e argumentam que elas podem ser resultado de intemperismo natural, não apresentando diagnóstico inequívoco de ação glacial. Segundo a equipe, não há evidências robustas de glaciação recente na Planície de Salisbury.
Fragmento Newall Boulder no centro do debate
Descoberto durante perfurações há um século, o Newall Boulder passou a influenciar pesquisas nos anos 1990, quando geólogos o usaram para sustentar a tese de transporte glacial. Em 2024, outro estudo reforçou essa leitura, relacionando microdesgastes no fragmento a processos subglaciais.
A investigação atual comparou a composição e as feições do Newall Boulder com amostras coletadas em Craig Rhos-y-felin, afloramento rochoso no País de Gales. Foram identificadas semelhanças consideradas suficientes para apontar que o fragmento se desprendeu de uma das chamadas pedras azuis do próprio Stonehenge.
Origem das rochas e distâncias percorridas
Stonehenge começou a ser erguido por volta de 3000 a.C. com blocos vindos de diversas regiões da Grã-Bretanha. As pedras azuis, menores e mais numerosas, têm origem nas colinas de Preseli, a cerca de 240 quilômetros do sítio arqueológico.
Outra peça emblemática, a Pedra do Altar, possui composição que a vincula a áreas hoje situadas na Escócia, mais de 700 quilômetros ao norte. A presença desses materiais tão distantes sempre levantou questionamentos sobre o método de transporte na pré-história.
A teoria glacial procurava explicar as grandes distâncias ao sugerir que camadas de gelo, presentes durante antigas eras frias, teriam deslocado os blocos naturalmente. Na visão dos pesquisadores do novo artigo, contudo, a rota glacial proposta não se sustenta diante da ausência de depósitos deixados por geleiras na região.
Para eles, o transporte humano, possivelmente por meio de trenós, rolos de madeira e vias fluviais, continua a ser a explicação mais coerente. A movimentação teria ocorrido ao longo de vários séculos, mobilizando comunidades neolíticas em grandes empreendimentos coletivos.
Os autores ressaltam que o fragmento analisado não exibe abrasões lineares típicas de blocos arrastados sob espessas camadas de gelo. Em vez disso, as fissuras e lascas podem ser atribuídas a fraturas internas expostas à erosão depois que a rocha foi posicionada no monumento.
Além disso, a correspondência mineralógica entre o Newall Boulder e rochas de Craig Rhos-y-felin fortalece a ideia de que o fragmento integra o conjunto de pedras azuis, cuja extração no País de Gales já havia sido comprovada por escavações anteriores.
Essa convergência de dados repõe o papel das populações neolíticas como protagonistas do empreendimento. Embora permaneçam dúvidas sobre os exatos caminhos percorridos, o novo estudo afasta a hipótese de que processos naturais tenham desempenhado a principal função logística.
Sem indícios geológicos de glaciação no sul da Inglaterra e com compatibilidade entre amostras galesas e o fragmento de 1924, a equipe conclui que os blocos foram movidos intencionalmente por pessoas há milênios. A pesquisa reabre discussões sobre tecnologia, organização social e motivação ritual associadas à construção de Stonehenge.