A Meta, controladora de Facebook, Instagram e Threads, foi alvo de nova denúncia por permitir a exibição de anúncios pagos que solicitavam doações para adquirir drones e outros equipamentos militares destinados às Forças de Defesa de Israel (IDF), contrariando suas próprias diretrizes de publicidade.
Levantamento da organização de defesa do consumidor Ekō identificou ao menos 117 anúncios desse tipo desde março de 2025. As peças pediam contribuições financeiras específicas para itens táticos como drones, tripés de tiro e sistemas de vigilância, todos classificados pela plataforma como produtos de uso potencialmente letal.
Investigação aponta 117 anúncios irregulares
A Ekō rastreou as publicações após receber relatos de usuários que notaram campanhas de arrecadação em favor de batalhões israelenses. Entre os responsáveis pelos anúncios estavam a ONG Vaad Hatzedaka e o músico Mayer Malik, que, segundo o levantamento, somaram milhões de dólares em doações ao longo do período analisado.
Embora a IDF não tenha promovido oficialmente essas campanhas, depoimentos coletados pela entidade indicam que soldados receberam drones de baixo custo financiados pela rede de doadores privados. As entregas ocorreram mesmo com a proibição da Meta de veicular ofertas relacionadas à venda ou doação de armas e acessórios letais.
As políticas internas da big tech exigem que qualquer conteúdo com tema político ou social inclua avisos legais e divulgue o responsável pelo pagamento. Nenhum dos 117 anúncios analisados continha a identificação necessária, segundo a Ekō, o que configuraria violação dupla das regras.
Reação da empresa e remoção tardia
A Meta removeu os materiais apenas após ser questionada pela imprensa. Em nota enviada a veículos internacionais, a companhia admitiu que as peças infringiam normas sobre transparência política, mas não comentou por que passaram pela filtragem prévia. A plataforma informou ter reforçado os sistemas de detecção, embora campanhas semelhantes continuem a surgir de forma intermitente.
Fontes ligadas à empresa afirmam que a revisão humana não detectou a brecha, e que o sistema automatizado falhou em classificar os anúncios como conteúdo militar sensível. A Meta não divulgou detalhes sobre eventual punição às contas envolvidas nem sobre reembolso de valores gastos em impulsionamento.
Conflito com leis europeias e britânicas
Além de violar as diretrizes internas da plataforma, a veiculação dos anúncios pode ferir a Lei de Serviços Digitais da União Europeia (DSA), em vigor desde 2023. A norma exige que plataformas online removam rapidamente conteúdos que incentivem financiamento de atividades militares estrangeiras sem transparência adequada.
No Reino Unido, legislações nacionais proíbem instituições de caridade de angariar recursos para forças armadas de outros países. Em 2024, uma entidade britânica já havia sido advertida ao promover campanha em benefício de um soldado israelense, caso que serve de precedente para possíveis sanções.
Na França, dispositivos semelhantes enquadram ações desse tipo como captação irregular de recursos, sujeitando organizadores e intermediários a multas e até suspensão de atividades. Especialistas em direito digital avaliam que a Meta pode enfrentar processos em múltiplas jurisdições caso autoridades concluam que houve omissão deliberada.
A DSA estabelece ainda que grandes plataformas devem manter relatório público sobre anúncios de natureza política, incluindo dados sobre financiamento e alcance. A ausência dessas informações nos casos identificados poderá levar a investigação formal pela Comissão Europeia, com previsão de multas de até 6% do faturamento global.
Até o momento, a Meta não confirmou se notificará voluntariamente reguladores europeus. A empresa declarou apenas que “mantém diálogo contínuo com autoridades competentes” e que “cumpre todas as leis aplicáveis nos mercados em que opera”. Organizações civis exigem mais transparência e revisão imediata das rotinas de aprovação de anúncios.
A Ekō, por sua vez, planeja encaminhar relatório detalhado à Comissão Europeia, aos reguladores britânicos e às autoridades francesas. O documento inclui capturas de tela, valores de impulsionamento e estimativas de alcance para cada um dos 117 anúncios detectados. A entidade defende penalidades e maior supervisão sobre a publicidade voltada a objetivos militares.
Enquanto avançam as investigações, especialistas observam que a situação expõe fragilidades no sistema de verificação da Meta, que tem enfrentado críticas recorrentes sobre moderação de conteúdo e cumprimento de normas internacionais. A continuidade de campanhas semelhantes sugere que o desafio regulatório deve persistir nos próximos meses.