Informações divulgadas por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro indicaram, na última semana, que o governo dos Estados Unidos estaria avaliando novas sanções ao Brasil, entre elas o corte do sinal do Global Positioning System (GPS). A especulação ganhou repercussão nas redes sociais entre 19 e 21 de julho de 2025, logo após a revogação de vistos de ministros do Supremo Tribunal Federal.
A possibilidade levantou dúvidas sobre a dependência brasileira desse serviço de navegação por satélite, usado em celulares, meios de transporte e diversas atividades econômicas. Especialistas, porém, destacam limitações técnicas e impactos globais que tornam o desligamento amplo improvável no curto prazo.
O que motiva o debate sobre o bloqueio do GPS
A hipótese de sanção surgiu no contexto de tensão diplomática após decisões judiciais que atingiram o ex-presidente Bolsonaro, incluindo restrição de acesso a redes sociais e uso obrigatório de tornozeleira eletrônica. Com a escalada do embate, aliados do ex-mandatário ventilam que Washington poderia retaliar Brasília retirando o acesso ao GPS, sistema originalmente militar dos EUA.
Ainda que não exista confirmação oficial, a mera possibilidade criou discussões intensas no X (antigo Twitter). Usuários questionaram como seriam trajetos cotidianos, operações logísticas e voos sem o auxílio da rede de 31 satélites norte-americanos.
Como o sistema GPS funciona
Desenvolvido pelo Departamento de Defesa dos EUA durante a Guerra Fria, o GPS opera com 31 satélites distribuídos em seis planos orbitais. Cada satélite transmite sinais de rádio que trazem posição e hora exata, baseando-se em relógios atômicos de alta precisão.
Para determinar a localização de um receptor, é necessária a leitura de pelo menos quatro satélites. O dispositivo compara o tempo de envio e de recepção do sinal; a diferença, multiplicada pela velocidade da luz, indica a distância de cada satélite, permitindo a triangulação da posição.
O serviço civil disponível ao público é denominado Standard Positioning Service (SPS). Já as forças armadas norte-americanas usufruem do Precise Positioning Service (PPS), com precisão e criptografia superiores.
É tecnicamente viável desligar o sistema?
Especialistas afirmam que, em tese, os EUA poderiam alterar parâmetros de transmissão ou criptografar o sinal civil, limitando o acesso em áreas específicas. Contudo, essa medida afetaria usuários em países vizinhos e poderia prejudicar operações próprias dos EUA que dependem de cobertura global, inclusive rotas aéreas e marítimas internacionais.
Restrições totais versus interferências locais
Existem duas formas principais de impedir o uso do GPS. A primeira seria a modificação direta no sinal, considerada inviável operacionalmente porque exigiria alterações na infraestrutura espacial e em receptores de todo o mundo. A segunda envolve interferências locais, como jamming e spoofing, técnicas empregadas pela Rússia em conflitos recentes para neutralizar drones e mísseis guiados.
No jamming, transmissores terrestres emitem ondas de rádio capazes de sobrepor ou bloquear a frequência original, tornando o receptor incapaz de decodificar a mensagem. No spoofing, transmissores falsos enviam dados enganosos, levando a erros de posição. Embora eficazes em áreas limitadas, ambas as práticas demandam equipamentos próximos ao alvo e, segundo analistas, seriam classificadas como atos de sabotagem se usados em território brasileiro por forças estrangeiras.
Impactos para o Brasil e alternativas existentes
Caso uma restrição generalizada ocorra, setores como aviação, navegação marítima, telecomunicações, transporte rodoviário, logística e serviços financeiros poderiam enfrentar atrasos e custos adicionais. Mesmo assim, o país não ficaria completamente sem referência espacial.
Os receptores atuais de smartphones, aeronaves e navios já são compatíveis com diversas constelações. Entre elas, o GLONASS, da Rússia; o Galileo, da União Europeia; o BeiDou, da China; o NavIC, da Índia; e o QZSS, do Japão. A constelação chinesa, por exemplo, conta com 46 satélites operacionais e cobertura considerada a mais ampla do planeta.
Na prática, equipamentos modernos combinam sinais de diferentes sistemas para alcançar maior precisão e disponibilidade. Por essa razão, mesmo que o GPS fosse interrompido, muitos aparelhos continuariam operando ao captar satélites de outras nações.
Outra camada de proteção envolve a navegação inercial e rádios VOR utilizados pela aviação, além de redes de torres celulares capazes de estimar posição por triangulação terrestre. Tais recursos não substituem plenamente a constelação norte-americana, mas reduzem a vulnerabilidade a um corte repentino.
Especialistas consultados ressaltam, por fim, que qualquer medida extrema exigiria cálculo político detalhado, já que a supressão global ou regional do GPS poderia gerar repercussões econômicas e diplomáticas desfavoráveis aos próprios Estados Unidos.